quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Cicatrizes do Passado

Era uma tarde normal da semana. Os dois estavam em um parque distante das outras pessoas. Sorriam, conversavam entre si, caminhavam sem rumo de mãos dadas. Não se tinha certeza sobre o que falavam, mas quem olhava tinha certeza que os dois eram felizes. Aparentemente, eram aquelas duas pessoas que quando juntas eram incapazes de sentir o resto do mundo, incapazes de notar se estava frio ou calor. Beijavam-se. O momento idealizado desenhava o pôr-do-sol da tarde curta, na qual o tempo era inimigo do prazer. Os rostos estavam muito próximos. Trocavam olhares silenciosos, detalhistas. A intimidade já era muito maior. Toda demora acabava sendo compensada por esses momentos. Ela adorava contornar com os dedos a pequena cicatriz que ele tinha no pescoço. Apesar de adorar, nunca havia feito sequer uma pergunta sobre ela. A graça era a forma engraçada que tinha e, de fato, conhecendo o dono da mesma, deveria ter uma história no mínimo interessante sobre ela. Mas preferia não saber. Queria manter o mistério em torno do seu pequeno deleite adicional, afinal, falar sobre tudo poderia fazer os momentos perderem a graça. O medo que tinha era que não tivesse mais primeiras vezes para compartilhar.
Ela abriu novamente os olhos, com um suave sorriso no rosto, os olhos brilhantes, lembrando daquele dia. Tantas lembranças. Tantas. Começou a pensar no que aconteceu na semana seguinte àquele dia e sua expressão mudou completamente, no lugar daquele sorriso agora se encontrava um lábio apreensivo, trêmulo. E no lugar daquele brilho nos olhos, era possível ver uma lágrima escorrendo pelo seu rosto.
Caminhavam rápido. A proximidade já vinha trazendo problemas para os dois lados. As feições já não eram tão nítidas. Discutiam. Perguntas impossíveis, respostas evitadas. Caminhos tendendo ao desencontro. Aos poucos vem à tona as verdades escondidas na idealização em trânsito. Aos poucos notaram que era tudo mero fruto da novidade, da descoberta. E de repente estavam como motorista e carona, em alta velocidade. A lágrima caía ao mesmo passo que os pingos da chuva das horas anteriores escorriam pelo vidro semi-aberto. O carro sutilmente diminuía seu ritmo e o ponteiro de gasolina tendia ao zero - ali era inevitavelmente a parada final. Ele tocou sua mão, deu um longo beijo em seu rosto e sussurrou em seu ouvido: "Foi eterno enquanto durou...", pegou seu casaco que estava no banco traseiro e continuou seu caminho a pé. Por alguns minutos, talvez horas, ela ficou ali parada, com a mão recém-tocada fechada em punho. Vazia.

Naquele momento as lágrimas escorriam sem cessar pelo seu rosto. Já não tinha mais controle sob seus pensamentos. A noite seria longa. Deitou-se novamente, sem saber o que estaria por vir.

2 comentários:

  1. Eu amo os seus textos, Ale, sério.
    Só você consegue detalhar as coisas tão delicada e suavemente (até quando algo ruim está acontecendo). Acho isso incrível!

    Te amo muito, melhor amiga! ♥

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  2. Que tocante, linda. Intenso também. Sabe aquelas histórias em que você lê e imagina a cena? São uma dessas. Finais tristes são tão belos quanto os finais bons - pelo menos quando está somente na escrita.
    Às vezes é assim mesmo. Tudo é novidade, tudo é paixão. Mas uma hora sufoca, não passa disso, não surge conhecimento e toda aquela necessidade que era para aumenta, vai embora.
    Tem um selinho para ti no meu blog, bem interessante por sinal. Dê uma olhada. Você não é obrigada a aceitá-lo, mas achei uma boa brincadeira. As regras são legais.
    Um beijo, da @pequenatiss.

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Silêncio

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